terça-feira, julho 13, 2004



fui gente
agora quero voltar a ser bicho


salamandrine 09:54



segunda-feira, julho 05, 2004



chego cansada e irritada. estado de espiríto neura, raiva melancólica.
and then music....
quando a música é suficiente para me trazer a paz, então tudo está bem.
ando sem paciência para palavras. ando muda. não quero que me falem. gosto que me esqueçam.
nada sou se de mim não se lembram. nada me é exigido se não existir a não ser para mim.
responsável por mim. só respondo por mim. só respondo para mim. o que dizem não me interessa. as suas vozes cansam-me.
o meu saldo de tempo para os outros está constantemente negativo.
futebol, politica, emprego... invadem tudo, todo o espaço que preciso manter meu. tanto ruido, tanto barulho. ocupam todo o espaço, consumindo todo o oxigénio, não deixando espaço para outras vidas respirarem em mim.


Thomas Dybdahl - ...that great October sound Kaada - Mecd The White Birch - Star Is Just A Sun

salamandrine 22:19



sábado, junho 26, 2004



e aí a temos, a festa de portugal....
vamos ter um PM da caras, um ex-PM que decide que a sua carreira e prestígio estão à frente de qualquer país no qual empenhou a palavra dele e a vida dos outros.
que importam as promessas e os tais projectos de 1 mandato, ou mais?
que importa se neste momento o nosso governo tem uma extrema-direita não eleita no poder, e vai ter um PM que não foi a cara do seu partido, nem tão pouco fazia parte das listas do mesmo, na altura das eleições.
temos um país governado por simpatias e interesses pessoais.... e ainda se fala em democracia! palavra cada vez mais usada da mesma maneira que os vivas portugal, vazia de significado. o portugal que se dá o viva é a nação do estádio. a democracia, é a que vive no dicionário.
mas que ganhe portugal na quarta-feira! o resto não tem importância. portugal é isto mesmo.

se encontrarem a tampa do ralo, avisem.

salamandrine 15:08



domingo, outubro 12, 2003


Filhos de famílias com algum relevo social
assim se referiu JPP, membro do partido do governo, no telejornal da SIC ao falar dos estudantes universitários - que deviam ter mais tento na língua porque são "filhos de famílias com algum relevo social"

é assim que pensa a maioria no poder - só estudam os que podem, os que têm dinheiro, os que pertencem a "famílias com algum relevo social".
os outros, os outros que procurem o seu lugar, porque não têm direito a estar nas universidades portuguesas - não têm direito a estudar, a tirar um curso nem aspirarem a ser quadro-médio de alguma empresa...

é demonstrativo da política e das ideologias do partido no poder.

salamandrine 20:16



segunda-feira, setembro 22, 2003


Somos todos prisioneiros!
Prisioneiros das fronteiras dos países onde nascemos. Não somos livres de circular, de mudar de vida, país, lingua, emprego... Estamos presos com amarras ao lugar onde nascemos.
Com as condições económicas actuais seria, para a maioria de nós, um acto de loucura lançar-se no acaso de emigrar para outro país. E mesmo tendo as condições financeiras para o poder fazer, quem nos garante de podermos ficar no país que escolhemos? Quem nos garante que nos vai ser dada a legalidade para podermos viver onde decidimos que queriamos ficar?
Seremos nós propriedade de um país? As fronteiras são mais uma maneira de controlo de pessoas e de exercício do poderio de alguns sobre muitos.
O controlo de emigração, o controlo de entradas de estrangeiros, a perseguição que lhes é feita, tudo isso é gerador do tráfico de pessoas. Haveria lugar para o sórdido negócio se nos pudessemos movimentar livremente entre países?

Seria assim tão negativo para a economia de qualquer país a livre circulação de indivíduos? Tem sido sistemáticamente provado que a imigração estimula a economia e traz dinheiro. O controlo de criminosos seria sempre possível. Mas a necessidade de ter que se ter autorização de um governo para lá residir é apenas uma limitação à liberdade indivídual.

a liberdade não existe....

salamandrine 12:32



sexta-feira, setembro 12, 2003


E eles estão de volta!!!


Artistas Unidos

E as saudades que eu tinha!!! :)))))
Desde 2000 que vou a todas as peças desta companhia. Chegar Setembro era sentir o prazer de voltar ao teatro. De ver gente real num palco. De ver textos fantásticos, actores apaixonados, espaços inventados...
O fecho da Capital senti-o com a tristeza de ter perdido algo insubstituível.
Ontem fui ao Taborda! Setembro voltou!!! :))))


A Festa de Spiro Scimone

A Festa - Artistas Unidos

Teatro Taborda - 11 de Setembro a 12 de Outubro



Victoria Station de Harold Pinter

Victoria Station - Artistas Unidos

Teatro Taborda - 11 de Setembro a 12 de Outubro



T1 de José Maria Vieira Mendes

T1 - Artistas Unidos

Teatro Taborda - 23 de Outubro a 16 de Novembro de 2003


Reposições:


T1 de Spiro Scimone

Nunzio - Artistas Unidos

Teatro Taborda - 17 de Outubro a 2 de Novembro de 2003



O Encarregado de Harold Pinter

Nunzio - Artistas Unidos

Teatro Taborda - de 5 a 16 de Novembro de 2003



salamandrine 13:46



quinta-feira, julho 31, 2003



"Eu não sofro de insanidade, aprecio cada minuto dela."

Edgar Allan Poe




salamandrine 14:30



terça-feira, julho 15, 2003


Apontamentos sobre Nietzsche
Os ataques de Nietzsche à ideia moderna de democracia têm como pano de fundo a convicção profunda (certamente baseada na sua experiência da Europa do seu tempo) de que existe uma sobreposição entre democracia e igualitarismo, ou seja, que a ideia de democracia está presa da ideia de indiferenciação entre os indivíduos que se anulam inevitavelmente.


in prefácio para O Anticristo, António Marques

salamandrine 10:26



domingo, julho 13, 2003


O telejornal!
Tiazorras de oitentas a falar de erros da natureza. Putos de 18 anos com tesão porque vêm lésbicas na telenovela das nove, mas que nem pensar em ver 2 gajos aos beijos!
Nada muda. Não acredito na evolução nem na frescura de uma nova geração.
A merda é sempre a mesma. Os preconceitos são todos os mesmos. A única coisa que mudou é que agora não existe uma censura que proiba falar-se no assunto. Ainda assim, temos a censura da audiência. Lésbicas sim, beijos não. As audiências caem e matam-se as lésbicas.
Miudos e miudas continuam a torcer o nariz quando vêm um casal do mesmo sexo. Adoram ser politicamente correctos - está na moda - e dizem que "acham graça" e que não têm nada contra - mas quem lhes diz que eles não NADA para estarem contra ou a favor a maneira de estar, de viver, de outra pessoa!!! Tadinhos!!! Acham graça!!! Acham graça aos freeks of nature que são os gays e as lésbicas! Como antes se tinha pena e não se deixava de ir ver porque era "educativo", os deficientes mostrados em desfile nos circos.
Nada muda! A mentalidade será sempre a mesma, a da intolerancia, a da carneirada, a da busca constante pelo lugar dentro dos iguais e a marginalização de tudo o que ameaça o desmoronar dessa igualdade cega.



salamandrine 20:14


Estou a ler José e os Seus Irmãos de Thomas Mann. Ainda não sei que pensar deste livro. Ao primeiro impacto entusiasmou-me e interessou-me.
Mann ou investigou muito para este livro, ou tem conhecimentos alargados e profundos de história e mitologia relacionada com religião.
Nesta primeira parte Mann disseca todos os mitos das crenças cristãs, desde o dilúvio, onde procura fenómenos naturais que possam justificar o mito - que também é encontrado numa mitologia chinesa -, ao mito do primeiro homem.
Entre a filosofia e a crença religiosa Mann apresenta a história do Romance da Alma com a matéria, cujo resultado é o mundo. O fim do mundo acontecerá com o fim do romance. Fala da paixão de Deus pelo homem e da animosidade dos seus anjos com o mesmo. Fala da queda de Semael, o seu anjo de 12 asas: Semael achava "absurdo que seres criados na refulgência da glória suprema se inclinassem diante de quem fora formado do pó".
Pelo caminho que Mann vai traçando, cruzamo-nos ainda com a Babilónia e o Antigo Egipto, o povo Hebreu e uma mistura enorme de mitos e crenças e religiões, que a igreja dos nossos dias diria ser, no mínimo, herége.
Todo este misticismo é-nos relatado como uma desconstrução dos mitos. Como se ao clarificá-los mostrasse a irrealidade dos mesmos. Ou apenas a procura de explicação para os mitos de hoje, a apresentação de todas as interpretações possíveis. Uma busca ao início da história da origem dos mitos. Algo que nos faça compreender o porquê daquela "história", de onde surgiu o mito do primeiro homem ou o do Dilúvio....

Ainda estou a tentar compreendê-lo :)



salamandrine 18:49



sábado, julho 12, 2003



Ciclo Peter Sempel



Deliciei-me com este ciclo. Ver o Cave e o Blixa no grande ecrã soou-me irresistível.
Já me tinha "cruzado" com o site do Sempel há algum tempo... bastante tempo parece-me. Na altura vi por lá os filmes e as fotos e fiquei a babar-me a olhar para aquilo e a pensar que nunca iria passar-me pelas mãos/olhos.

Quando me cruzei com a informação relativa a este ciclo posso dizer que fiquei um pouco mais que contente.
Estive no Goethe na segunda. Foi uma sessão pouco ortodoxa e que pode não ter agradado aos mais exigentes que estavam à espera de uma coisa mais profissional.
Sempel não ligou ao programa - sinceramente nem me pareceu que ele soubesse o que é que estava anunciado no programa - e resolveu mostrar-nos alguns clips de filmes e pequenos vídeos escolhidos por si.
Desde A Nina Hagen a cantar Liebe com um ar de freira sensual, a um home-made-movie com o Nick Cave a brincar com filho, num intervalo de filmagens do Jonas At the Ocean - com direito a ouvi-lo ler um trecho do livro de Jonas Mekas "I had Nowhere to Go", ou um vídeo incomodo e claustrofóbico dos Einsturzend Neubaten.
Tivemos também direito a um fenomenal Blixa Bargeld Black&White, sussurrando Johny Guitar. Hipnótico!

Na quarta fui ao Fórum Lisboa ver o Dandy. Fiquei um pouco preocupada quando começo a ouvir falar alemão e não vejo legendas, mas o filme sobrevive perfeitamente sem o texto. Vive essencialmente do som (e que som! - Bach, Cave, Neubaten...) e das imagens, algumas delas lindissimas.

Ciclo Peter SempelDandy - Nick Cave & Blixa Bargeld


Dandy - Blixa Bargeld e as Pirâmides



Just Visiting This Planet - Kazuo Ohno       Nick Cave






salamandrine 14:40



quinta-feira, julho 10, 2003


BULLETPROOF... I wish I was
Limb by limb and tooth by tooth
Tearing up inside of me
Every day every hour
I wish that I was bullet proof

Wax me
Mould me
Heat the pins and stab them in
You have turned me into this
Just wish that it was bullet proof

So pay the money and take a shot
Leadfill the hole in me
I could burst a million bubbles
All surrogate and bullet proof

And bullet proof
And bullet proof
And bullet proof


Radiohead


salamandrine 13:05



quarta-feira, julho 09, 2003



Actualmente na nossa sociedade, existe nas pessoas uma tendência, muitas vezes sublinhada pela imprensa e pelos outros meios de comunicação, para procurarem a derrota. A partir do meu próprio campo de actividade, conheço numerosos casos dessa automutilação que faz com que indivíduos de valor reduzam por sua própria escolha as suas possibilidades de evolução. Existe uma categoria inteira de pessoas que ao longo de toda a vida querem tão obstinadamente ser doentes que acabam por já não saber distinguir a doença da saúde. Esta forma de invalidez voluntária é relativamente transparente quanto às suas intenções. A partir da ideia, decerto exacta, de que a nossa sociedade moderna exige uma eficácia a cem por cento dos seus cidadãos, nasce em numerosos membros dessa sociedade, um medo do fracasso perfeitamente compreensível. Pretendendo-se com tantos ou tantos por cento de enfermidade, os cidadãos obtêm uma espécie de seguro contra o fracasso e este seguro, para muitas mais pessoas do que costumamos imaginar, passa a ser a única coisa que torna suportável a vida.

Só que o facto de nos afundarmos não passa de uma etapa, de uma fase de paragem no caminho. O fenómeno mais notável é a vontade crescente de buscarmos a derrota mais total, a enfermidade mais completa, a degradação mais profunda. depois de ter examinado a questão, dando-lhes todas as voltas possíveis, cheguei à seguinte conclusão que não passa de uma série de perguntas: não teremos experimentado demasiadas vezes a miséria da vitória, do sucesso e da glória para continuarmos a ter a força de imaginar atingir a salvação por essas vias? O que é a salvação? É, julgo eu, o processo através do qual conseguirmos de repente suportar a ideia de que esta vida é vazia, fria, indiferente, um nada. Se, como decerto devemos fazer, partirmos da hipótese segundo a qual a faculdade de suportar este conhecimento, precioso entre todos, é indispensável ao homem, então põe-se uma outra questão: Em que momentos seremos mais acessíveis à salvação? Teremos a ousadia de responder: a vitória não nos traz qualquer apoio firme, a glória é para nós um deserto onde nos morre a alma? Todos nos perguntamos: Em que pensam os outros homens quando estão sozinhos? Se pensam como nós, por que é então que nunca o sabemos? Talvez saibamos todos a mesma coisa sem nos atrevermos a revelá-la uns aos outros? Talvez nos perguntemos: Onde está o amigo que procuro em todo o lado? Talvez o encontremos, todos nós, quando amarfanhados e em sangue o descobrirmos deitado, amarfanhado e em sangue, também ele, no fundo desse abismo para onde nos impele o nosso desespero? Mais fundo, mais fundo ainda, grita-nos o nosso desejo e por isso não interrompemos a nossa queda. Não é por amarmos a queda que caímos, não é por gostarmos de rastejar na noite que rastejamos, não é por amarmos a morte que a procuramos, porque a morte, nós sabemo-lo bem, não passa da punição por termos vivido. Talvez, simplesmente, esperemos descobrir nas trevas uma luz que a própria luz nos recusa, talvez esperemos descobrir na solidão um amigo que a comunidade dos outros nos nega.

Será isto o que nos está a acontecer? Não sei, porque se vale deveras a pena sabê-lo, são só suposições o que nos resta.


in As Sete Pragas do Casamento, Stig Dagerman




salamandrine 21:57



segunda-feira, julho 07, 2003


O Que as Crianças Americanas Não Podem Ler
Regras recolhidas em "The Language Police", de Diane Ravitch, a partir das directivas de editores de manuais e exames para escolas dos EUA. Note-se que este rol não é exaustivo; uma lista semelhante ocupa mais de 30 páginas no livro de Ravitch, que diz continuar a receber novos exemplos dos seus leitores.

· palavras proibidas

- Actriz (palavra considerada sexista; usar actor para os dois sexos)

-Adão e Eva (usar "Eva e Adão", para mostrar que os homens não têm precedência)

- Anão (usar "pessoa de reduzida estatura")

- Deus (banida por ter ser discriminatório para os não cristãos)

- Diabo (idem)

- Dogma (considerada etnocêntrica, usar doutrina)

- Escravo (substituir por "escravizado")

- Gordo (usar obeso ou pesado)

- Homem Cro-Magnon (usar "pessoas Cro-Magnon")

- Iate (banida, considerado elitista)

- Maluco, Doido (usar "pessoa com problemas emocionais")

- Leste, Oeste (consideradas eurocêntricas quando usadas para descrever regiões planetárias, usar apenas os nomes de continentes)

· temas a evitar em textos de manuais

- Magia, sobrenatural

- Morte

- Aborto

- Doenças

- Teoria da evolução

- Religião

- Questões militares

- Desporto

- Terminologia agrícola, financeira, jurídica, científica

- Política

- Estilos musicais "controversos" (rap, rock n' roll)

- Desemprego

- Criaturas "assustadoras" ou "sujas" (ratos, morcegos, escorpiões)

·livros banidos

- "Huckleberry Finn", Mark Twain

- "Não matem a cotovia", Harper Lee

- "Admirável Mundo Novo", Aldous Huxley

- "Uma agulha no palheiro", J. D. Salinger

- "Adeus às Armas", Ernest Hemingway

- "Diário", Anne Frank

- "As vinhas da Ira", John Steinbeck

- "Voando Sobre um Ninho de Cucos", Ken Kesey

- "Fahrenheit 451" (ironicamente, um livro cujo tema é a censura), Ray Bradbury

- "Harry Potter", J.K. Rowling


http://jornal.publico.pt/2003/07/07/Sociedade/S03CX01.html


salamandrine 16:45


Se fosse uma comédia, seria daquelas que provocam gargalhadas pelo surreal da situação, por tocar as raias do absurdo...



Pressões de Grupos Radicais Provocam Censura nas Escolas dos EUA


Por PEDRO RIBEIRO
Público, Segunda-feira, 07 de Julho de 2003



Um manual de liceu propunha um texto sobre um homem cego que, sem ajuda, subiu ao cimo do monte McKinley (no Alaska, a maior montanha dos EUA). O texto foi rejeitado pelo Departamento de Educação do estado norte-americano de Nova Iorque. Os motivos: primeiro, a história era discriminatória para os deficientes - porque sugere que as pessoas com deficiências físicas têm mais dificuldade em cumprir algumas tarefas. Segundo, a era-o também para as crianças que vivem em regiões planas, que ficam em desvantagem perante os alunos que têm experiência de zonas montanhosas.

Este é só um dos exemplos citados em "The Language Police", um livro da historiadora da educação Diane Ravitch sobre as práticas de autocensura na edição de manuais escolares e de exames nos EUA. Ravitch conta como as pressões de grupos radicais, à esquerda e à direita, intimidaram as autoridades escolares e as editoras a retirar qualquer passagem dos textos que possa ser vista como "ofensiva".

A auto-censura nas escolas americanas foi exposta no ano passado quando o "New York Times" noticiou que os exames de literatura no estado de Nova Iorque expurgavam ou reescreviam várias passagens de textos de autores clássicos que incluíssem palavras ou ideias que pudessem ser entendidas como "discriminatórias" ou "perturbantes".

Numa passagem de um texto de Ernesto Galarza nesse exame, um homem descrito como "um português gordo" era alterada para "um português pesado". Ravitch, no seu livro, conta como esta prática está generalizada no sistema educativo americano.


Nem corujas nem bolos

Por exemplo, a palavra "gordo" não pode ser usada, porque é ofensiva para as pessoas "pesadas" ou "obesas". Não se pode falar em corujas, porque na cultura de uma das tribos índias (outro termo que não se pode usar, deve falar-se em "primeiras nações americanas") dos EUA a coruja é símbolo de morte. Aliás, não se pode falar de morte, violência, sexo ou quaisquer temas políticos ou sociais que tenham o mínimo de controvérsia, porque isso pode perturbar as crianças.

Este código de censura não é unificado, porque nos EUA não há um ministério da educação centralizado. O ensino americano é regulado por "school boards", administrações locais cujos membros são escolhidos por eleições gerais. Cada "school board" elabora as suas directivas para garantir que os manuais escolares ou exames não são "ofensivos".

A outra vertenta da auto-censura está nas próprias casas editoriais. Muitos manuais foram alvo de campanhas da parte de grupos de activistas que objectavam ao seu conteúdo. Por isso, as editoras têm equipas de censores que analisam todos os conteúdos, de forma a evitar qualquer espécie de controvérsia.

Isso resulta num ramalhete de proibições. Uma história sobre amendoins foi rejeitada porque há pessoas alérgicas a este alimento e, além disso, os manuais devem evitar referências a comidas "não nutritivas" (não pode haver bolos, doces ou carne).

O movimento de auto-censura começou nos anos 60, com noções de senso comum como não mostrar indivíduos de minorias étnicas como sistematicamente pobres. Agora nunca podem ter minorias étnicas como pobres.

Da mesma forma, para evitar acusações de discriminação por idade, pessoas idosas só podem aparecer se estiverem a "fazer compras, dançar, participar em desportos activos"; não podem ter "bengalas, sapatos ortopédicos ou cadeiras de rodas" e é proibido mostrá-las em cadeiras de baloiço, a tricotar, em jogos sedentários como jogar cartas, ou a "falar do antigamente".


"Bowdlerizar" os clássicos

As directivas são formuladas através da "combinação do fundamentalismo religioso de direita e do politicamente correcto de esquerda", escreve Ravitch. Estes grupos "pretendem criar uma nova sociedade, completamente inofensiva para todos; para lá chegar, é preciso uma boa dose de censura".

Ambos os grupos acreditam no poder da linguagem e numa capacidade totalitária das escolas de moldar o pensamento das crianças. Os campos mais afectados pela "polícia da linguagem" são a história, o ensino da língua e a literatura (muitos livros "controversos", incluindo a maioria dos clássicos da língua inglesa, são banidos e substituídos por textos de autores semi-desconhecidos; nas palavras de um editor citado por Ravitch, "nenhum livro escrito antes de 1970" pode ser utilizado).

Mas até disciplinas aparentemente "neutras" podem ser afectadas. Os livros de matemática incluem biografias de mulheres ou indivíduos de minorias étnicas com contributos para esta ciência, para cumprir o objectivo de apresentar uma "visão multicultural"; os de biologia não podem referir a teoria da evolução de Darwin para não ofender os cristão criacionistas.

Quando o "New York Times" descreveu algumas destas práticas nos exames do estado de Nova Iorque, houve grande discussão pública. Muitos críticos atacaram duramente a "bowdlerização" de textos clássicos ("bowdlerizar" é um termo da língua inglesa que apareceu no século XIX, quando um editor inglês chamado Thomas Bowdler resolveu lançar uma versão "limpa" das obras de Shakespeare, chamada "Shakespeare para a Família")

As autoridades escolares de Nova Iorque prometeram não voltar a incorrer nesta prática, mas os testes deste ano reincidiram. Diane Ravitch contou ao PÚBLICO que, por exemplo, uma passagem em que é usada a expressão "meu amor" foi alterada para "meu amigo". "Talvez nos próximos exames as coisas mudem..."


http://jornal.publico.pt/2003/07/07/Sociedade/S03.html

salamandrine 16:39



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